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INTRODUÇÃO:

AS COSTAS AINDA ARDEM

“Existem alguns códigos que perpassam pelo seu comportamento, como você se identifica, como você se vê, como você se comporta, como você se relaciona com as pessoas culturalmente, socialmente e politicamente. E quando você assume uma identidade racial você passa a transmitir mensagens o tempo todo” - Danieli Saucedo (Falashewa)

M

 

adureira é, antes de tudo, quente. Quente, aliás, como todo o Rio de Janeiro, cidade cujo clima teima em desafiar as estações mais frias do ano. Madureira, um dos bairros mais populares da ..... ..................

da capital, também é pulsante, tem ritmo. É tão agitado como as batidas que regam o samba de suas duas escolas de berço: Portela e Império Serrano. Não à toa, o local que também é morada dos famosos bailes charme sob o viaduto Negrão de Lima, é há muito tempo conhecido como o “coração da Zona Norte”. Mas nem só do balanço de seus sambas é feita a pulsação desse lugar. É ali, bem perto de Oswaldo Cruz, que milhares de histórias se cruzam.

 

Olhar para o calmo azul do céu que preenche o teto da rua Carvalho de Souza quase faz esquecer que aquele é um local que parece nunca descansar. A multidão nas ruas lembra, de certo modo, os grandes mercados africanos ao ar livre descritos em alguns livros de História. É tanta vida, é tanta gente. Um esbarrão de um ambulante aqui, um cheirinho de milho recém cozido na barraquinha dali. São milhares de pessoas passando todos os dias nos caminhos tomados por lojas, produtos, sons, cores, comidas e, principalmente, pelo povo.

 

Logo mais à esquerda, em um dos prédios da rua Maria de Freitas, um reduto feminino de beleza preenche uma das salas do edifício comercial nº 87. Do corredor do terceiro andar já é possível ouvir várias vozes falando ao mesmo tempo em meio a gargalhadas gostosas, de quem ri com os olhos quase fechados. São mulheres que conversam sobre suas vidas, famílias, amores e aflições enquanto fazem o cabelo. Em meio ao clima leve e de bom astral, algumas trajetórias semelhantes são contadas, dicas sobre a saúde do cabelo são compartilhadas e uma realidade comum à todas: ali há mulheres negras cuidando não apenas da imagem que veem no espelho, mas também reconstruindo seus próprios conceitos de beleza.

O que diz o espelho

A dona da risada é Sandra Nascimento, 52, a “Tia”, como é chamada pelas funcionárias do local. Foi ela que passou para Nathalya Nascimento, 34, sua filha e proprietária do salão Fast Braids, o gosto pelo belo, além do trato com os cabelos. Sandra conta que desde pequena Nathalya sempre foi vaidosa e adorava ter os fios trançados. Após cursar Gestão em RH e não conseguir colocação no mercado de trabalho, Nathy, como é mais conhecida, se especializou na prática das tranças, transformando o que antes era uma atividade complementar em renda principal.

Há pouco mais de um ano, a trancista montou seu espaço em Madureira a fim de melhor atender suas clientes. “Além de manter o meu sustento, as tranças me proporcionam o privilégio de ajudar mulheres negras a se enxergarem lindas, com a sua ancestralidade e a sua autoestima renovada para se impor nessa sociedade racista que todos os dias tenta nos dizer o contrário do que nós realmente somos”, diz Nathalya, enquanto desembaraça o cabelo de uma cliente.

A recriação da imagem vista no espelho é assunto recorrente no salão Fast Braids. A partir dela é que muitas mulheres negras passam a ter noção de quem são e de como querem ser vistas pelos outros. “É legal as pessoas fazerem uma leitura sobre você a partir da sua imagem”, declara Priscilla Silva, 32, uma das clientes mais assíduas do salão, enquanto conversa com as trancistas do lugar. Ela conta só ter percebido a questão profunda por trás da estética após ir trançada para o trabalho: “Eu fui percebendo como era um movimento político eu estar de tranças ou eu estar sem tranças dentro do ambiente que eu vivia, que era um ambiente empresarial branco”, afirma.
 

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Pode parecer que é só estética, mas tu não deixa, mesmo que não seja diretamente, de estar levantando uma bandeira quando tu te afirma”

QUÊNIA LOPES, TRANCISTA

Como um cartão de visitas

Seja ao vestir uma roupa, fazer uma trança, usar maquiagem ou escolher determinados acessórios, o corpo transmite ideias a todo tempo e auxilia na formação das identidades, visto que muitas vezes ele expressa fisicamente o que cada pessoa está sentindo em certo momento. É por meio do corpo, também, que os sujeitos emitem e recebem mensagens na sociedade. Gestos, mímicas, sensações e até mesmo jogos de sedução estão diretamente relacionados à forma com que cada um se comporta nas situações cotidianas, tornando a corporalidade a principal forma de contato entre os seres humanos.

 

Em uma realidade cada vez mais repleta de imagens tanto nas redes sociais quanto nos jornais, revistas e programas de televisão, a estética, a política, a moda e o consumo acabam criando relações intensas e, algumas vezes, recíprocas. David Le Breton, sociólogo, antropólogo e psicólogo francês, afirma que o corpo do ser humano é uma espécie de conector: aproxima uns aos outros. “O corpo não é somente uma coleção de órgãos arranjados segundo leis da anatomia e da fisiologia. É, em primeiro lugar, uma estrutura simbólica, superfície de projeção passível de unir as mais variadas formas culturais”, diz um trecho de seu livro “A Sociologia do Corpo” (2007).

 

Para Le Breton, a aparência pode ser compreendida como um instrumento político que inclui desde a maneira com que cada um escolhe se vestir à forma de se pentear ou cuidar do rosto, por exemplo. Segundo o autor, o corpo humano possui não apenas funções fisiológicas como também comunicadoras, fazendo do estilo de cada indivíduo uma espécie de “cartão de visitas vivo”.

 

Nem só roupas, adereços e gestos corporais podem ser interpretados como formas de se expressar. Algumas partes do corpo também constituem meios de comunicação. Em algumas culturas mostrar a língua é um insulto, assim como cruzar as pernas pode ser um gesto bem problemático para algumas sociedades. E é em um instrumento fundamental para o trabalho de Nathalya e as trancistas do salão Fast Braids que consiste uma grande riqueza de informações que a estética humana é capaz de transmitir: o cabelo.

O cabelo acaba sendo uma baita ferramenta pra gente mostrar todo esse processo de apropriação do nosso corpo, de usurpação do nosso ser”

KARLA RAYMUNDO, TRANCISTA

Nathalya posa para foto em frente a uma das janelas do salão Fast Braids - Foto: Gabriela Isaias

A espessura das mechas é definida a partir do tipo de cabelo e do pedido de cada cliente - Foto: Gabriela Isaias

Textura de tranças feitas com material jumbo, de acabamento fosco - Foto: Gabriela Isaias

Do alto para as costas

Não muito longe da rua onde fica o salão de Nathalya, há um outro espaço reservado às tranças africanas. Percorrendo duas quadras de calçadas agitadas pelo fluxo de pessoas, chega-se ao espaço Afro Atitude. Fica ali, na rua Carolina Machado, seguindo a linha do trem, logo depois do tão famoso viaduto de Madureira. Olhando para janela do prédio de pastilhas brancas, ainda na rua, é possível ver Juliana Marinho, 26, dona do salão, com suas mãos ágeis, trançando a cabeça de uma moça que se olha no espelho.

Foi quando criança que Juliana teve seu primeiro contato com o mundo das tranças. “Uma coisa que me vem muito na memória quando eu lembro de trança é que era um momento meu com a minha mãe: ela reservava todo aquele tempo pra cuidar de mim enquanto eu sentava no chão, entre as pernas dela, e ela trançava o meu cabelo”, recorda a trancista, com os olhos fixos no movimento de suas mãos, que iam de um lado para o outro, entrelaçando as mechas de cabelo da cliente.

Enquanto conta um pouco da história de seu próprio cabelo, Juliana revela que a sua autoestima, como a de tantas outras mulheres, está diretamente relacionada aos fios. “Quando o seu cabelo tá bem feito aquilo reflete em você: quando ele tá bonito você já estufa o peito, levanta o nariz, tu já é outra pessoa. Agora quando o cabelo não tá legal você murcha totalmente”, afirma. 

A paixão de Juliana pelas tranças começou quando ela percebeu que através da técnica poderia ter os fios mais longos: “Imagina pra uma menina que sempre teve o cabelo pro alto, sentir o cabelo comprido batendo nas costas”, sorri. Ela conta que ter cabelo comprido é um sonho de infância bastante comum entre as crianças negras. “O nosso cabelo é crespo, não cresce pra baixo; ele cresce pro alto e toda menina quer andar jogando o cabelo”, diz, acrescentando, entre risos: “A criança preta que nunca botou um pano na cabeça pra jogar e fingir que tinha cabelo comprido não é uma criança preta!”.
 

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Sereias, hippies e Medusa

É provável que nenhuma outra parte do corpo humano sofra tanta interferência quanto o cabelo. Cortes, raspagens, tinturas, descolorações, luzes, alisamentos, permanentes, hidratações, implantes, apliques, cronogramas, lavagens, escovações, penteados: começar a pensar como os cuidados cotidianos com o cabelo estão repletos de significado facilita a compreensão de lendas e contos, preconceitos, leituras sociais e até mesmo de vários fatos históricos.


Afinal, o que faz com que as sereias sejam quase sempre representadas penteando suas longas madeixas? Por que a força de Sansão estava em seus cabelos? Serpentes na cabeça de Medusa, tranças douradas no conto de Rapunzel. Perucas empoadas na corte de Luís 14, penteados espalhafatosos popularizados por Maria Antonieta na França pré-revolucionária. Na China de 1850, os participantes do maior levante de massas do século 20, a rebelião camponesa Taiping, mostravam sua rebeldia em relação à dinastia imperial deixando os cabelos crescerem.

Em períodos mais recentes da História, as melindrosas dos anos 1920 adotaram cabelos mais curtos, os hippies da década de 1960 optaram por um visual cabeludo, enquanto a partir de 1970 o volume dos cabelos cheios tomou as pistas de dança. Monges, celibatários e algumas freiras ainda hoje raspam a cabeça na hora da conversão espiritual. Noivas usam guirlandas e véus no dia do casamento, rapazes têm as cabeças raspadas quando ingressam na universidade e até mesmo promessas religiosas são feitas ofertando as madeixas como sacrifício. Guardar uma mechinha de cabelo de um recém-nascido como lembrança ainda é costume entre várias famílias e, mesmo nos dias atuais, há certa resistência entre os setores mais conservadores da sociedade quanto a um corte de cabelo curto em mulheres e comprido nos homens.

 

Mesmo em anos em que a economia nacional apresenta déficits, o setor de cosméticos capilares acumula lucros. Segundo o levantamento feito em 2017 pela Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos, o Brasil ocupa a quarta posição no ranking mundial de consumidores de produtos de beleza, ficando atrás apenas dos Estados Unidos, da China e do Japão. Pesquisas da empresa Kantar também revelam que a venda de produtos capilares fez o mercado brasileiro de cosméticos movimentar 5,6 bilhões de reais no ano de 2016. Mas, afinal, o que torna o cabelo (ou a ausência dele) tão relevante nas culturas ao redor do globo?

Fontes: Instituto Beleza Natural, Universidade de Brasília (UnB) e ABIHPEC

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O mundo vivo e o sobrenatural

Alguns pensadores elaboram teorias que esclarecem porque a trancista Juliana e tantas outras pessoas relacionam o cabelo à autoestima e aos códigos de aparência. Leusa Araújo, escritora e jornalista brasileira, explica que, mais do que um símbolo de poder, fertilidade e força vital, o cabelo participa intimamente da constituição das identidades e da eterna busca humana pela beleza ao longo da vida. “Para a maioria dos povos e religiões, a cabeça – caput, para os romanos, axé para os iorubás – é a sede do cérebro, órgão que contém a alma e, portanto, a força vital de uma pessoa”, afirma a autora, na obra “Livro do Cabelo” (2012).

 

No livro, Leusa explica que a fibra capilar é composta por uma proteína insolúvel ultrarresistente: a queratina. Essa substância não se deteriora facilmente, fazendo com que os cabelos demorem mais tempo para se decompor, quando comparados às outras partes do corpo humano – o que o torna símbolo de ressurreição e vencedor da deterioração e da morte em várias culturas. A autora diz ainda que, por serem únicos e guardarem resquícios de vida, muitas nações conferem às madeixas um “poder mágico” capaz de caminhar entre o mundo vivo e o sobrenatural.

 

O fato do cabelo estar no topo do corpo também ajuda a compreender o porquê de sua importância na cultura de vários povos. Na Grécia de centenas de anos atrás, o filósofo Platão já observava que a cabeça humana corresponde à “imagem do mundo”. Vários símbolos de hieróglifos antigos do Egito também mostram que o crânio era tido como uma espécie de céu devido ao seu formato circular. Não à toa, as coroas dos reis são posicionadas na parte mais alta do corpo, a fim de mostrar poder e sinalizar que seu governo é dirigido pela mente (que também fica na cabeça) do monarca.


Há vários trechos da história humana repletos de proibições, censuras, castigos e estigmas estabelecidos por governos, religiões, argumentos científicos e até mesmo senso comum. Leusa Araújo explica que, assim como algumas outras partes do corpo, a aparência do cabelo não escapou às regras e castigos instituídos a prisioneiros por autoridades e exércitos nas regiões conquistadas. “O escalpo como troféu de guerra, o cabelo raspado nos navios negreiros e prisões ou nos campos de concentração nazistas, o cabelo reciclado para fazer agasalhos mostram essa face do horror”, declara a autora. A jornalista acrescenta que o corte involuntário do cabelo ainda ocorre nos dias de hoje e é um ato desumanizador “que busca apagar identidades pessoais, étnicas e religiosas”.

A gente entende que não é qualquer pessoa que coloca a mão na cabeça da outra porque a cabeça é um canal. Aqui no salão a gente tem muito essa preocupação porque é uma troca de energia que rola durante o trançar. A trancista fica ali duas horas, três horas trocando energia com a cliente e fazendo uma coisa que a pessoa vai carregar com ela”

FABIO ALVES, EMPRESÁRIO

Mechas de cabelo artificial são separadas por nós antes de serem trançadas - Foto: Gabriela Isaias

É preciso vestir branco

Perceber de que maneira cada tipo de cabelo é retratado nos meios de comunicação e os efeitos dessas representações na vida cotidiana é muito importante. Em nações em que a raça determina a manutenção do poder e as classes sociais da população, os sinais físicos mais aparentes da etnia de uma pessoa – como o cabelo e o tom de pele – são muitas vezes julgados e rotulados como inferiores. Entre as texturas de cabelo mais estigmatizadas pela sociedade destaca-se a crespa.

 

Cabelo “ruim”, “duro”, “pixaim”, “sarará”, “bombril”, “de vassoura”, “carapinha”, “de bandido”, “bucha”. Quantos termos pejorativos para se referir ao cabelo crespo você consegue enumerar? Nove foram os nomes que Andreia Cardoso, 45, listou antes de desistir da contagem: são inúmeros os insultos e outras expressões depreciativas que ela já ouviu sobre seus cabelos. Trancista há 15 anos, Andreia guarda na lembrança o tempo em que sua mãe trançava seus fios e também os das suas cinco irmãs. Ainda na infância ela aprendeu a cuidar dos cabelos e começou a constatar a existência de um determinado tipo de beleza a ser seguido pelas mulheres. “A gente acha que o bonito é o que tá padronizado pela mídia e o padrão é você ter cabelo liso, tudo que é diferente daquele padrão é [considerado] feio”, afirma.

 

A lógica do padrão tido como “belo” por tantos setores da sociedade ocidental, geralmente governada por brancos, é eurocêntrica: traços finos, pele clara e cabelos lisos, tal qual a estética das populações caucasianas. Em seu livro “Aqui Ninguém é Branco” (2009), a pesquisadora e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro Liv Sovik explica que “a supervalorização do branco é um fenômeno mundial, com particular vigência em lugares que foram colonizados por europeus que implantaram a escravidão”. Liv afirma que, no Brasil, ser branco é uma espécie de aval social que sinaliza certa autoridade, eliminando algumas barreiras facilmente encontradas por pessoas de pele escura.

 

A prática de disfarçar o pertencimento étnico e tomar a cor branca como modelo estético é chamada de “embranquecimento cultural” e promove a camuflagem de traços negros para diminuir a discriminação e, consequentemente, ter uma capacidade maior de ascensão na sociedade. É assim que várias identidades são renunciadas: a pele escura é repudiada, o nariz largo é suavizado, os lábios grossos são disfarçados e até lentes de contato mais claras podem ser usadas para esconder os indícios de negritude. E o cabelo? Entre algumas mechas trançadas na cabeça da cliente, Andreia faz uma pausa, pensa e diz: “As nossas mães alisavam o nosso cabelo com cinco, quatro anos de idade. A gente já saía da maternidade com uma pasta na cabeça”.

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O homem preto raspa, a mulher preta alisa. Quando você é mais clara, você disfarça sua negritude, você disfarça seu nariz. É o dito ‘pardo’, né? Você disfarça a sua cor”

KARLA RAYMUNDO, TRANCISTA

A partir da paleta de cores

Em vários países do continente americano que passaram por regimes de escravidão negra, houve um esquema de divisão de trabalho que considerava o tipo de cabelo e o tom de pele dos africanos critérios determinantes para cada uma das funções. Ainda na obra “Livro do Cabelo” (2012), Leusa Araújo afirma que “o sistema escravista estabeleceu divisões entre os negros levando em conta não apenas as habilidades que traziam de suas regiões de origem, mas a aparência”. Segundo a autora, escravos de pele mais clara e cabelos mais lisos eram os escolhidos para trabalhos domésticos na casa-grande, enquanto aqueles de cor mais escura e cabelos mais crespos eram destinados aos serviços braçais.

 

O tempo da escravidão parece distante, porém seus efeitos permanecem enraizados na sociedade brasileira até os dias atuais. Autores como César Sabino, doutor em sociologia e antropologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, observam que os meios de comunicação, mesmo quando destacam a beleza negra, o fazem em períodos específicos. O sociólogo afirma, também, que as poucas mulheres negras que conseguem destaque possuem a pele clara e os traços faciais próximos ao padrão caucasiano. Em sua tese, intitulada “O Peso da Forma”, Sabino declara: “Ela, a mulata, está presente com mais freqüência na TV, e mídia em geral, no período do carnaval, sendo que após a onda da folia momesca, retorna para a lanterna da hierarquia estética midiática da qual as negras estão excluídas”.

 

É desse modo que o sistema de discriminação racial começou a criar nuances para que a sociedade brasileira permanecesse tendo o branco como maioria da população. Além de estratégias explícitas, como, por exemplo, o incentivo à imigração europeia no país nas primeiras décadas do século 20, os níveis de oportunidades ainda hoje são determinados pela paleta de cores que vai do bege mais claro ao marrom mais escuro. Quanto mais próximo do tom claro, mais oportunidades; quanto mais perto do tom escuro, menos chances na sociedade. Já o “meio termo”, o “café com leite”, mais próximo da pele branca, foi classificado em uma nova categoria pelas autoridades brasileiras: ganhou o nome de “mestiço”, “pardo” ou “mulato”.

 

Antes de finalizar uma das últimas tranças feitas na cabeça da cliente, Andreia comenta que o passado recente da escravidão no Brasil é lembrado e discutido cada vez mais à medida que informações sobre a história negra são trazidas à tona. Para a trancista, a história de seus antepassados nunca deve ser esquecida: “As pessoas dizem que eu falo ‘como se tivesse sentindo a chibata no lombo’. Mas toda vez que eu falar vai ser como se a chibata tivesse ardendo nas minhas costas”.

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